Estrutura e Relações Familiares

4.abr.2013

Estrutura e Relações Familiares

A família, nos dias de hoje, apresenta-se com diferentes estruturas e configurações. Tratando-se de um contexto denominado pós-moderno, este em que vivemos atualmente, falta-nos uma perspectiva exata para defini-la, dadas as transformações ocasionadas pela própria evolução dos tempos, havendo inclusive, vários modelos em uma mesma família, formada por pessoas de origens diferentes, motivadas por valores também diferentes.

Apesar de todas as mudanças sofridas ao longo dos tempos, cabe ressaltar a importância da função psicossocial da família em relação a seus membros, que não deixa de ser fundamental em tempo algum e sobrevive a quaisquer mudanças.

O papel da família é o de, fundamentalmente, promover o atendimento das necessidades básicas de seus membros, as quais se podem definir como sendo de natureza física, social e afetiva. Como diz Winnicott (1999, p.144) “temos, pois, duas coisas distintas: as tendências inatas do bebê e o lar que você lhe proporciona. A vida consiste na interação dessas duas coisas”.

As necessidades físicas referem-se à sobrevivência: abrigo, segurança e alimento. Já as de natureza social e afetiva, dizem respeito ao desenvolvimento emocional e cognitivo, constituindo-se a identidade, a individualidade, o sentimento de pertencimento, amparo e proteção dos sujeitos a ela pertencentes.

Neste contexto, cabem algumas considerações sobre o ambiente, que influencia diretamente as configurações familiares. A esse respeito, pode-se falar em famílias saudáveis, ou funcionais, e famílias disfuncionais. Vejamos como se caracteriza cada uma delas.

As famílias saudáveis ou funcionais, segundo Macedo (1994, p. 186), caracterizam-se por um “ambiente acolhedor, continente, podendo as relações entre seus membros serem caracterizadas como amorosas, carinhosas e leais”, e as disfuncionais, ainda conforme a mesma autora, propiciam a convivência em um “ambiente disjuntivo e os relacionamentos assumem características de ódio, culpa, vingança”.

Nas primeiras, o crescimento de seus membros é promovido, nas segundas, bloqueado. Trata-se, aqui, da qualidade do ambiente e das vivências nele realizadas, aliada aos processos internos do sujeito em desenvolvimento. Como diz Winnicott (1999, p.148) “o suprimento ambiental ou fornece uma oportunidade para que ocorra o processo interno de crescimento, ou então impede que tal aconteça”.

A despeito deste ambiente, questões como a comunicação, as regras e limites, a própria organização da rotina, as relações de poder, são aspectos muito importantes na constituição e manutenção das famílias e devem ser levados em consideração em qualquer análise que se faça, seja qual for o objetivo em questão, visto que estão todos inter-relacionados. Como afirma Zimerman (1999, p.104), “uma família bem estruturada requer algumas condições básicas, como é a necessidade de que haja uma hierarquia na distribuição de papéis, lugares, posições e atribuições, com a manutenção de um clima de liberdade e de respeito recíproco entre os membros”.

Além disso, essas são questões que contribuem de forma decisiva na formação dos indivíduos, como nos elucida Winnicott (1989, p.103) a respeito da família “cuja estrutura se relaciona com a estrutura da personalidade do indivíduo”. Disto podemos inferir o quanto é importante proporcionar à criança um ambiente saudável, que proporcione o pleno desenvolvimento se suas potencialidades, que lhe proteja e lhe desperte o prazer de viver, caso contrário, pode ocorrer um “fracasso do suprimento ambiental” (WINNICOTT, 1999, p.149), gerando danos ao saudável crescimento.

Mas, apesar de se saber do imenso valor de um lar saudavelmente constituído, a bem da verdade não podemos deixar de dizer que não há lar perfeito no mundo, nem família perfeita ou ideal. Todas as pessoas têm problemas e todas as crianças, em algum momento de seu desenvolvimento, revelam algum sintoma, alguma pista de que algo não vai perfeitamente bem. Conforme Winnicott (1982, p.142), “mesmo o mais carinhoso e compreensivo ambiente de vida familiar não pode alterar o fato de que o desenvolvimento humano vulgar é árduo e, na verdade, um lar perfeitamente adaptativo seria difícil de perdurar, visto que não haveria qualquer alívio através de uma cólera justificada”.

Sabendo-se, então, que embora se procure prover de forma o mais satisfatoriamente possível as necessidades das crianças, não se alcançará o ideal, tampouco se verá um crescimento livre de qualquer deslize que o comprometa ou dificulte de alguma forma, cabe analisar-se o que um sintoma pretende demonstrar.

O sintoma tem o papel de, basicamente, mostrar algo que quer se esconder. Algo que não está bem estruturado, resolvido, que pede atenção, mas que não pode aparecer por completo, mostrando-se como é. Constitui-se como um dos recursos que, nas palavras de Winnicott (1982, p.143), “a natureza forneceu para defesa contra a angústia e o conflito intolerável”.

Mas o sintoma, em si, não é o problema. Pelo contrário, é um pedido de ajuda que pode se expressar das mais variadas formas: uma enurese, uma rejeição aos alimentos, uma dificuldade de aprendizagem, uma gagueira, entre tantas outras possibilidades. Esta manifestação que, muitas vezes, preocupa e incomoda encontra lugar de expressão no brincar. Por isso, recomenda-se a estimulação da capacidade de brincar da criança.

Se uma criança estiver brincando, haverá lugar para um sintoma ou dois, e se ela gostar de brincar, tanto sozinha como na companhia de outras crianças, não há qualquer problema grave à vista… Suas brincadeiras revelam que essa criança é capaz, dado um ambiente razoavelmente bom e estável, de desenvolver um modo de vida pessoal e, finalmente, converter-se num ser humano integral, desejado como tal e favoravelmente acolhido pelo mundo em geral. (WINNICOTT, 1982, p.143)

Cada família busca, à sua maneira, enfim, oferecer o melhor possível ao desenvolvimento de seus membros, da forma que considera mais adequada. O que será feito com isso que é oferecido depende, em grande parte, do próprio sujeito, daquilo que é capaz de conseguir naquele momento, frente aquela experiência singular. Neste jogo de interações e relações múltiplas desenvolvem-se os sujeitos que vem a se constituir criadores de sua própria história.

 

Educação e Limites na Família

Os limites constituem um ponto de fundamental importância no contexto familiar, bem como fora dele, quando se pensa em educação. Assim como na sociedade, também na família devem existir certas regras e limites que garantam a sobrevivência e a boa convivência de todos.

Cada família tem sua estrutura e uma organização particular que rege seu funcionamento, de forma que as regras nela presentes determinam o modo como se relacionam os seus membros. Como explicita Macedo (1994, p.189):

… quanto mais claras, explícitas forem as regras, tanto mais fácil a educação das crianças e as relações intra e extra-sistema. Ocorre porém que tais regras se baseiam em crenças, valores, adquiridos em grande parte na família de origem dos pais e permeiam as relações cotidianas quer através de ordens expressas, ou sendo adquiridas através de negociações diárias…

A criança precisa de limites para se sentir segura e protegida, assim como precisa também de disciplina, com amor e respeito. Brazelton e Greenspan, médicos americanos que se dedicam ao estudo do desenvolvimento infantil, afirmam que “quando a disciplina é vista como ensino e é transmitida com muita empatia e sustentação, as crianças se sentem bem sendo obedientes. É um sentimento bom e acalentador, sentir que você é o brilho no olhar de outra pessoa” (2000, p.158).

O ambiente familiar deve prover as necessidades de afeto, atenção e segurança da criança, de modo que se possam estabelecer relações de confiança. Além disso, é necessário que se saiba o que se pode ou não fazer, havendo clareza e coerência nos limites estabelecidos e, fundamentalmente, que estes sejam sustentados e cumpridos.

Dessa forma, os pais ensinam aos filhos, gradativamente, a importância do controle de suas atitudes, através do diálogo, da discussão dos problemas, da reflexão sobre seus atos e suas respectivas conseqüências, favorecendo o desenvolvimento da autonomia.

As crianças devem vivenciar adultos fazendo por eles o que esperamos que elas eventualmente façam para si mesmas e para os outros. Não é apenas o testemunho ou a observação que ensina, é fazer parte de um relacionamento em que certas atitudes, valores, ideais e objetivos são parte de interações sustentadoras de adulto- criança (BRAZELTON e GREENSPAN, 2000, p.159).

Os limites são necessários à preservação da vida, à convivência social, ao exercício da criatividade, à aprendizagem e exercício do respeito, à construção da confiança, e inúmeras outras questões que poderiam ser citadas aqui.

Inicialmente estabelecido pelos pais, serve de parâmetro para a tomada de decisão dos filhos, ajudando-os a saber agir diante das situações que exigem uma escolha. Não havendo esse limite, a criança terá apenas seus desejos como parâmetro de decisão ou, de outra forma, estará sempre sujeito às ordens e decisões de outros.

A educação, tanto familiar quanto escolar e social, ensina a criança a lidar com esses desejos, dominando-os e buscando a melhor forma de agir. O que se deseja é que a criança usufrua de sua liberdade de decisão, de forma segura, consciente e autônoma.

Fonte: Psicologado


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